Retirado do Blog do Cosme Rímoli, serve até como contra-argumento daquele meu post sobre futebol-resultado x futebol-arte. Admito que bateu até uma saudades desse futebol envolvente, que foi a conclusão que cheguei no meu post, prefiro o título, mas se vier de maneira romântica melhor ainda. Apreciem o texto…

Telê Santana.
Quem conviveu com o treinador entende o porquê de ser reverenciado até hoje. Quando Telê e o jornalista nem imaginavam o que seria a palavra blog, foram inúmeras entrevistas. A partir do primeiro título mundial do São Paulo até a sua triste tentativa de assumir o Palmeiras, quando, infelizmente, já mostrava sinais da isquemia cerebral.
Mas esse período foi mais do que suficiente para entrar na legião enorme dos fãs eternos de Telê Santana.
Foram quase sete anos.
E essa convivência, marcada por boas histórias, revelações, provocações e até alguns bate-bocas, que permite o gostoso exercício de imaginação. Pensar o que Telê Santana faria se estivesse comandando as equipes envolvidas na disputa do título neste domingo histórico de 2009.
A começar pelo São Paulo.
Como cansou de fazer com o ex-presidente da Federação Paulista de Futebol, Telê enfrentaria sem medo o STJD. Não admitiria as suspensões de três partidas de Jean, Dagoberto e questionaria até a de Borges. “Não acredito em tribunal de futebol. Pessoas que nunca entraram em campo não têm condições de avaliar, julgar punir. São todos torcedores que ficam protegendo seu time”, dizia.
E cadê coragem para dar uma grande suspensão a Telê?
Depois de reclamar do gramado alto do Serra Dourada, o treinador iria assumir o risco. “No futebol há muita conversinha. Mas é tudo simples. Para ganhar é preciso atacar, não ter medo, querer ganhar.” E transformaria Hernanes no condutor da equipe. O jogador que deixaria a bola no chão, que conduziria a equipe à frente em bloco, utilizando principalmente as laterais. Os cruzamentos de Junior Cesar para Washington seriam perfeitos. Frutos de broncas e intermináveis treinos, algo parecido com o que fez com Cafu. Depois colocaria as duas mãos na testa, gesto que demonstrava a sua revolta, e admitiria que os brucutus venceram. Como não escalar o São Paulo com três zagueiros e três volantes? Não há mais jeito. Mas o toque do Mestre seria que todos soubessem tocar a bola, de cabeça erguida, como exigia. E o São Paulo teria a coragem desvairada de assumir o jogo. Mostrar que não valeria a pena ser heptacampeão na defesa, esperando apenas um contragolpe certeiro. Para ele ganhar de qualquer jeito não era ganhar. O São Paulo assumiria os riscos da sua filosofia romântica. Foi assim que ele deu o Brasileiro de 1991 ao clube do Morumbi. E ainda desancaria a possível mala branca ao Goiás, falando sobre o absurdo, a pouca vergonha que seria um jogador receber de outro clube para ganhar.
Situação que achava abominável.
E se Telê tivesse o Flamengo na mão?
Como seria a vida de Adriano? Ele teria de respeitar o time, os companheiros, a diretoria. Precisaria enfrentar as longas conversas na temida ’salinha do Telê’. Cobranças e mostra da importância de Adriano ao time. E, com a misteriosa bolha da queimadura no calcanhar esquerdo, o atacante estaria ao lado do técnico na preleção contra o Corinthians. Taticamente, o Flamengo de Andrade é a equipe que mais se assemelha aos times de Telê. O toque de bola envolvente e a beirada do campo muito bem explorada por laterais como Leonardo Moura e Juan. Petkovic teria ainda mais fôlego porque seria proibido de voltar para pegar a bola na intermediária do Flamengo. Jogaria do meio para a frente e teria mais força física para explorar o seu potencial ofensivo. E, esperto, faria pressionaria de Campinas o seu principal rival ao título. Falaria sobre a obrigação do São Paulo em ser heptacampeão, tetra seguido, já que teria o melhor elenco, clube que melhor trabalha nos bastidores, o que dá sorte com arbitragens e coisas assim. Telê adorava colocar ao seu principal adversário o papel de vilão.
O Internacional seria uma outra equipe com ele.
Nem pensar no 4-5-1 de Mário Sérgio. Com o treinador, o colorado exploraria mais o talento de D’Alessandro. Giuliano, apesar da pouca idade, não se desdobraria para marcar. Ele e o argentino D’Alessandro teriam como referência uma placa à beira do gramado,como Telê fazia com seus craques. E seriam proibidos de passarem por ela, voltarem um passo a mais do essa placa marcava. Telê faria como fez na sua passagem pelo Grêmio e protestaria antes contra o eixo Rio-São Paulo. Perderia muito tempo falando sobre a proteção histórica aos clubes paulistas e cariocas em todas as decisões. E não teria medo de enfrentar o rebaixado Sport. Para ele, quem brigava pelo título não deveria respeitar o último colocado. Nunca.
Ah…E se Telê Santana estivesse no Palmeiras?
Ele enfrentou a pressão do Palestra Itália. Ganhou, mas também foi pressionado pela parte rica da torcida. A que seria batizada , anos depois, por Felipão, pela turma do Amendoim. Telê teria dado jeito em Diego Souza. Repetido a fórmula que deu certo com Raí. Fazê-lo treinar a mais. Ele perceberia que Diego Souza está pesado. Como houve um período importante com Raí, discretamente, Diego treinaria a mais que os companheiros. E faria um regime que só sua esposa saberia. Ao contrário de Luxemburgo, que quando teve o dinheiro da Traffic para formar o elenco, Telê teria encontrado dois laterais talentosos. “Jogo se ganha pela beirada”, repetia à exaustão. E faria Vagner Love entender que a obsessão pela Seleção Brasileira e o egoísmo não ajudam o time. Escancaria o time contra o Atlético Mineiro hoje. É o tudo ou nada. Não adianta deixar o time com três zagueiros e três jogadores de marcação. O repertório para buscar o gol fica limitado demais. Telê não conquistou nenhum título pelo clube. Fez ótimas campanhas, mas, como hoje, faltou sincronia entre treinador e diretoria. As décadas passaram. Os defeitos no Palestra Itália seguem os mesmos.
Ah…E o seu querido Atlético Mineiro?
Clube para quem deu o único título, em 1971? Daria o que falta à equipe agora de Celso Roth: coragem. “O adversário precisa sentir que seu time tem certeza que vaivencer”,dizia. Foi exatamente isso que fez o Galo despencar, mais uma vez, na fase decisiva do Brasileiro. Jogadores que sempre foram coadjuvantes não se assumiram como condutores do time ao título. Muito pelo contrário. É fácil perceber que acreditaram ter ido longe demais. “Time que não se assume, que não sente que pode ser campeão, não ganha nada.”
A filosofia de Telê sempre foi simples. Dentro de toda sua austeridade… Seus cuidados com o gramado do Centro de Treinamento do São Paulo, a ponto de tirar ervas daninhas com a mão… Sua paranóica maneira econômica de viver, a ponto de morar na concentraçao são-paulina… Dos escondidos golinhos de cachaça que tomava nas noites frias de São Paulo… Das brigas quixotescas com a Federação Paulista e com a CBF… O que Telê deixou como uma cicatriz em quem conviveu com ele foi o seu amor ao futebol bem jogado. A busca insana pelo ataque. A raiva de colocar um volante marcador. Treinar um jogador só para perseguir, caçar o adversário no meio de campo, ele não se conformava, mas sabia que tinha de fazer. Por ele, colocava um goleiro e dez jogadores talentosos. Houve quem o chamou de pé frio pelas derrotas nas Copas de 1986 e, principalmente, na de 1982.
Mas seja sincero. Só para você. Ninguém vai lhe cobrar. Qual seleção lhe traz mais saudade?
A de 1982, eliminada pela Itália? A que preferiu atacar e perdeu quando só o empate bastava?
Ou a de 1994, campeã nos pênaltis e que tem Dunga e Parreira como seus símbolos?
Para lembrar os céticos, Telê foi bicampeão mundial e bicampeão da Libertadores. Com seu futebol romântico. Que só pensava no ataque… Por isso, quem conviveu com Telê Santana pode afirmar com toda convicção:
Esta rodada do Brasileiro seria muito diferente se os clubes envolvidos na disputa do título tivessem o privilégio de ter o Mestre como seu treinador…